António de Andrade — óleo existente na Academia das Ciências. Missionário exploradores jesuíta, admitido ao Noviciado em 1596, partiu para a Índia em 1600 com mais 19 companheiros (12 portugueses e sete italianos), na Armada do vice-rei Aires de Saldanha. Concluída a formação religiosa em Goa, foi mandado para Agra, como superior e visitador da missão de Mogol. Desejando averiguar as notícias que havia anos se espalhavam acerca do Tibete determinou a cometer essa jornada em março de 1624. Em Deli juntou-se a uma caravana de peregrinos que se dirigiam ao famoso pagode de Badrinath (à altitude de 3170 m). Em Maio estava em Srinagar, capital do Gahrwal (2300 m). Começou então a escalada das serras “mais fragosas e altas que parece a ver o mundo”, “caminhando até o alto de todas as Serras de onde nasce o rio Ganges de um grande lago, do qual também nasce outro rio carrega as terras de Tibete”. Transpondo o passo de Mana, a 5500 m de altitude, cabe-lhe a glória de ser o primeiro europeu a atravessar o Himalaia e a descobrir o ramo principal das nascentes do rio Ganges. Para lá do passo de Mana estendia-se o grande planalto do Tibete. Em Agosto estava em Tsaparang, capital do reino de Guge, sendo recebido favoravelmente pelo rei.

Os primeiros europeus a atravessar o Himalaia e atingir as nascentes do rio Ganges no século XVII, os jesuítas portugueses Bento de Góis e António de Andrade, foram protagonistas deste importante contributo da nação lusitana para o conhecimento pelos europeus desta parte do mundo.

Erradamente reivindicada pela historiografia britânica como pertencendo tal mérito aos exploradores Webb e Rapper, em resultado da expedição que ambos levaram a efeito em 1807 e que foi relatado no livro “A Sketch of the Geography and Geology of the Himalaya Mountains and Tibet” de Sidney Gerald Burrard, e Henry Hubert Hayden, porém, a verdade, é que 200 anos antes em 1624 António de Andrade, partindo de Goa, atravessou a cordilheira do Himalaia descobrindo uma das mais importantes nascentes do rio Ganges e penetrou no Tibete onde estabeleceu acordos e relações amistosas com o respetivo monarca e autorização para ali instalar uma missão católica.

É pois, a este explorador jesuíta, nascido em Oleiros, distrito de Castelo Branco, que se ficou a dever a descoberta da nascente mais importante do rio Ganges ao transpor o Passo de Mana a 5500 m de altitude.

Por intermédio dos seus escritos, designadamente por uma carta sua dirigida ao visitador da Índia, André Palmeiro, editada em Lisboa em 1626, acedeu-se a importantes informações sobre a etnografia, o clima, a fauna e a hidrografia da região, o que possibilitaria ao ocidente clarificar os limites da fronteira noroeste da China e obter informações sobre um dos mais importantes rios do globo.

Relevamos das suas palavras as seguintes: “começou a escalada das mais fragosas e altas serras que parece haver no mundo” e, mais adiante, “muitas vezes nos era necessário ir por cima da neve com o corpo, como quem vai nadando, porque doutra maneira nós afundávamos tanto… nos pés, mãos e rosto, não tínhamos sentimento, porque com o demasiado rigor do frio estávamos totalmente sem sentidos“.

Webb e Rapper, como refere o historiador holandês C. Wessels, limitaram-se a seguir o percurso que Andrade fizera e afirma: “sem precursores, sem mapas, sem experiências anteriores, primeiros etnógrafos, os jesuítas portugueses dos séculos XVII e XVIII, foram os pioneiros dos Himalaias no sentido mais completo do termo“.

A viagem de António de Andrade iniciada em 1624 teve, ainda que incompletamente, um precursor em 1607: a do açoriano Bento de Góis, reconhecidamente o primeiro europeu a entrar na China pelo ocidente e a identifica-la com o Cataio de Marco Polo.

Acerca de Bento de Góis, sabe-se que nasceu em Vila Franca do Campo, na Ilha de São Miguel nos Açores em 1562 e que, com 20 anos, partiu para a Índia como soldado, tendo mais tarde ingressado como leigo na Companhia de Jesus.

Prestou relevantes serviços na missão do Mogor, tendo conseguido ser amigo e conselheiro do imperador Akbar. Foi escolhido pelo seu superior padre Nicolau Pimenta para a expedição que este decidiu enviar através da Ásia Central, afim de esclarecer e identificar o Cataio.

A reconstituição da sua atribulada viagem e da sua morte ocorrida nesse ano de 1607 foi feita pelo superior da China, Mateo Ricci, documento que ficou inédito até 1911.

Bento de Góis morreria às portas da muralha da China no ano de 1607, depois de ter identificado claramente o Cataio com o Império do Meio sem contudo conseguir chegar à Pequim. Da sua curiosa e atribulada viagem retiramos as seguintes passagens: “Hiarcan é um famosíssimo mercado, tanto pela concorrência de mercadores como pela variedade de mercadorias. Nele dá fim à sua viagem a cáfila de Cabul e daí se organiza outro ao Cataio, cuja capitania é vendida pelo Rei por muito preço, dando ao Capitão, jurisdição real sobre os mercadores dela em todo o caminho“.

Daqui vieram a Turfan e dali a Aramuth e logo a Camul. De Camul, em nove dias, chegam às muralhas setentrionais da China, a um lugar chamado Shiaicuan, onde estiveram 25 dias esperando a resposta do Vice-Rei daquela província. Finalmente admitidos dentro das muralhas, entraram com um dia de caminho na cidade de Soceu onde, pelo muito que se falava de Pequim, se aprecebeu que estava perto de cumprir a sua missão“.

nota: leia-se sobre este tema o importante estudo Viagens na Ásia Central em Demanda do Cataio: Bento de Goes e António de Andrade com introdução e notas de Neves Águas.

José António Arez Romão @ Loyola #6